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Dicas

De Manaus a Belém de barco: como é fazer a travessia pelo Rio Amazonas

Programa de índio? Talvez. Experiência para a vida toda? Com certeza! São 1.600 km que separam Manaus de Belém por hidrovias. O trajeto só pode ser feito dessa forma ou por avião. Por terra seria inviável. Portanto, por anos e anos as embarcações vêm sendo a única ligação entre familiares que se mudam em busca de uma vida melhor e anos depois unem seus esforços para voltar e visitar seus parentes. São quase 5 dias de viagem de Manaus a Belém, o que faz desse um dos maiores trechos percorridos por barcos de linha no país. Quer saber como funciona? Vem comigo :)

 

Onde comprar uma passagem Manaus x Belém

Após algumas pesquisas na internet, encontrei uma empresa que me pareceu séria e de fato é – ufa! Ela tem uma das melhores embarcações, que faz longos percursos tanto na região de Manaus quanto na de Belém. O barco tem capacidade para 856 pessoas, é feito de ferro (enquanto a maioria é de madeira) e transporta cargas e pessoas. O nome da empresa é AR Transportes e, desde o atendimento telefônico, foram muito profissionais e já me passaram segurança.

De Manaus a Belém de barco

Navio Amazon Star – Faz a rota Manaus x Belém x Manaus

 

O que esperar do passeio Manaus x Belém

Desde a saída do porto de Manaus a experiência já se mostra instigante. É um festival de aromas e sabores nas barraquinhas, os “chapas” se oferecendo pra carregar as malas, ambulantes vendendo de tudo o que você vai precisar no barco… Enfim, assim começa o clima ali no porto de Manaus.

Ao longo do caminho é possível ver o encontro das águas entre o rio Negro com o Solimões, formando assim o rio Amazonas, após 11km correndo separadamente. Navegando por cerca de 1h você pode apreciar esse fenômeno. Próximo à cidade paraense de Juriti, no 2º dia, isso se repete em alguns momentos. Inclusive é possível ver alguns pontos com manchas de uma cor preta correndo sozinhas nas águas barrentas. O mesmo se repetiu nos arredores de Santarém, na manhã do 3º dia, quando o rio Patajós clarinho e transparente encontra o Amazonas barrento e veloz. Ou seja, você não precisa fazer essa famosa excursão que vendem a partir de Manaus, pois verá o encontro muitas vezes no caminho de Manaus a Belém.

Em Santarém você tem a grata opção de descer e conhecer a cidade. O navio atraca na noite do 2º dia – era umas 23h – e sai às 12h do dia seguinte. Veja uma sugestão de como conhecer Santarém nesse dia em Roteiro de um dia em Santarém com Alter do Chão – O caribe brasileiro.

Fora Santarém, nos outros portos não é possível fazer o mesmo, pois você tem apenas 30min ou 1h de intervalo e, geralmente, nada é muito por perto. Mas é interessante observar essas comunidades, as casinhas, as pessoas vendendo coisas para os passageiros… O caminho revela diversas paisagens, além de vilarejos e suas palafitas que aguardam a cheia. Mais adiante de Santarém começamos a observar o gado margeando o rio.

Finalmente no 4º dia navegamos pela Ilha de Marajó, que na verdade é um arquipélago! Foi uma surpresa incrível! Além das belas paisagens proporcionada pelas ilhas, deixamos o Amazonas e nos embrenhamos em canais bem menores, o que faz com que o barco fique bem próximo dos povos ribeirinhos. E foi aí que um fenômeno curioso começou a acontecer. Várias canoas pequenas começaram a vir ao nosso encontro e, quando percebi, eram todas com crianças! Meninos e meninas de 4 a 5 aninhos remando sozinhos! Paralelo a isso, vejo alguém, que na hora julguei ser um “imbecil”, jogando “lixo” no rio. No entanto, mais adiante entendi que isso era na verdade uma tradição centenária. Outros passageiros me contaram que, quando o barco passa por ali, as pessoas arremessam roupas e biscoitos em sacolas plásticas de mercado, que boiam no rio. Aí vêm as crianças nas canoinhas e as apanham. Ao longo desse dia, num percurso de mais de 5h, as canoas continuaram a nos margear. Até que improvisamos um pacote de biscoitos fechado em uma sacola plástica e também arremessamos. Já próximo a Breves, que é tipo uma capital da Ilha de Marajó, vimos vários pontinhos na água e, mais uma vez, eram crianças. Dessa vez elas tinham uns 12 anos e vinham nadando em direção ao barco. Aí elas se agarram nele, escalam pelas laterais e depois pularam do teto no rio novamente. Isso sem se falar das canoas “parasitas”, que grudam nos barcos grandes. Daí enquanto uma pessoa se segura no barco, a outra entra na embarcação para vender camarões, açaí, tapioca e até mesmo queijo de búfala.

No 5º dia chegamos a Belém pela manhã. O nascer e o pôr do sol brilhantes são uma cortesia que São Pedro às vezes nos presenteia ao longo de toda a viagem. Mas sem dúvidas, as amizades feitas ao longo do trajeto, as histórias, o aprendizado, a cultura e os ribeirinho são os ativos mais valiosos conquistados nessa experiência.

 

 

 

A embarcação

O navio que fez esse trecho Manaus x Belém foi o Amazon Star. Ele possui três andares, sendo o 1º para carga (carros, motos e sacas de castanha); o 2º onde fica um amplo espaço para cerca de 300 redes, os banheiros e um pequeno refeitório; e o 3º andar onde ficam a maioria das cabines, a sala de controle e a lanchonete. Além disso há uma área externa, onde tem alguns chuveiros ao ar livre.

Falta tomadas, uma área onde as pessoas possam passar o dia – leia-se “fazer uma social” – e o espaço das redes é bem abafado de dia e de noite. Mas quando ligam o ar a temperatura fica mais amena, portanto tenha sempre uma cobertinha, que pode ser um lençól ou uma canga.

 

 

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Trechos e paradas entre Manaus e Belém

São duas cidades no Amazonas e nove no Pará, sendo que é possível combinar qualquer uma dessas cidades. Por exemplo, você pode pegar a embarcação em Parintins e ir até Santarém. Nesses casos o valor acompanha proporcionalmente. Além do Amazon, que só sai às quartas-feiras, outros navios e outras companhia também operam esse trecho.

tabela amazon star De Manaus a Belém de barco

Itinerário Amazon Star

 

 

A cada parada muitos saem e muitos entram e é sempre uma oportunidade pra ver o porto fervilhar, observar e conhecer gente nova.

No primeiro dia tudo é novidade. Você tem que reconhecer o barco e marcar seu lugar nas redes. As noites são sempre divertidas – ou não, se você tiver problemas pra dormir. Eu acho que como 95% de quem está ali é local e está indo visitar a família, eles veem tudo como algo corriqueiro. Eles estão tão acostumados, que não veem novidade no passeio e, por algum motivo, invertem o dia pela noite. Por isso a madrugada é muito viva, é um bate papo sem fim e é muito engraçado. São várias as histórias e vocabulários que se aprende ali.

No 2º dia cedinho chegamos a Parintins. Ficamos ali durante quase 2h, pois esse tempo varia um pouco de acordo com a carga que se tem pra descarregar. Do porto, já era possível ver os detalhes da cidade, cuja a paisagem hora é vermelha, hora é azul. Mais um tempo de navegação e passamos por Juriti, onde é possível apreciar mais uma vez o encontro das águas. À tarde passamos por uma cidadezinha simpática e de casas coloridas chamada Óbitos. Por fim, às 23h atracamos em Santarém, onde muito descem para ir ao bar, para visitar um parente ou simplesmente para finalizar seu trajeto.

 

Como disse, Santarém é o único lugar que tem um intervalo maior. Portanto você pode aproveitar para conhecer a cidade, pois o navio só parte no dia seguinte ao meio dia. Então descemos, contratamos um táxi e fizemos um tour. Deu tempo inclusive de ir a Alter do Chão, que é a praia de água doce mais bonita do mundo e, não por acaso, apelidada de Caribe amazônico. Nesse dia ainda passamos por Monte Alegre e Prainha.

No 4º dia, ainda de madrugada, passamos por Almerin. Que pena ser tão cedo, pois é nesse momento que os ambulantes entram no barco pra vender mussarela de búfala com preço da fonte. Então imagine a festa! – que eu perdi, claro :-(

Nesse dia navegamos rumo a Breves. Em Gorupá entramos em um canal mais estreito, deixando a imensidão do Amazonas. Foi aí que passamos percorrendo o arquipélago conhecido como Ilhas de Marajó, que têm o tamanho do estado do Rio de Janeiro. Para mim foi o dia mais interessante! As paisagens são muito bonitas, já que a margem ficava mais próxima e dava para observar as casinhas lindas, simples e de madeira, às vezes coloridas e sempre suspensas em palafitas, com um embarcador para as canoas. Havia também sempre alguma criança se banhando, roupas no varal e até mesmo igrejas suspensas, que compõem a paisagem junto com as palmeiras de açaí, que se destacam da mata comum. Além disso, o fenômeno super interessante das canoinhas com crianças que se aproximavam o tempo todo ao longo do dia compõe um belo cenário!

 

Foi aí nessa região de Breves que, para a nossa surpresa, começamos a avistar as crianças que se aproximavam do barco, o escalavam e depois pulavam do 3º andar. Parece simples, mas pela proporção do barco diante do tamanho e da distânica que as crianças estavam, era meio assustador, rs.

 

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Até que no domingo de manhã chegamos cedo a Belém. Embora previsto para as 7h, chegamos depois das 10h da manhã. Então não marque nada com horário contado pro dia da chegada. A água já era bem mais clara e muito agitada, já que o mar está próximo e isso influencia muito. Ao descer do porto, tem carrinhos pra ajudar com as malas e na saída muitos taxistas. Sempre esteja muito atento, pois há muito roubos na cidade.

De Manaus a Belém de barco

 

 

Acomodações

 

Existem três opções:

 

1. Redes:

Existe uma área que à noite fica refrigerada e onde se penduram as redes. São muitas e isso dá um clima de superlotação. Você que traz a rede e a corda para amarrar lá. O valor é R$250 por pessoa nesse trecho. Às vezes você fica espremido, cada um tem um fuso horário e muitos passam a madrugada conversando. 4h da manhã parece 9h e há sempre pessoas levantando, passando por você, sacudindo sua rede e interrompendo o seu sono. Além disso há sempre umas três músicas tocando em celulares diferentes. Ao contrário do que eu esperava, apesar da superlotação e do ambiente fechado, não tivemos problemas com odores ou choro de criança. Quando lota demais essa área eles começam a liberar um espaço na lanchonete no 3º andar e aí a desvantagem é que não é área fechada, logo não tem ar e tem risco de chuvas e ventos entrando pelas laterais. Isso além do calor quando o barco está atracado. Mas essa é sem dúvidas a experiência mais rica! Uma oportunidade única de interagir com as pessoas, observar, aprender. Esse é o espírito caso você seja um turista que quer fazer essa travessia na sua forma mais genuína, como um local.

 

2. Camarote:

São cabines duplas, mas sem o banheiro. Custa R$1.000 pela cabine. Não acho que valha a pena, pois, pessoalmente, o ponto mais crítico é o banheiro e a diferença de valores não é alta. Seu layout e tamanho são como os da suíte, só que sem a parte do banheiro.

 

3. Suíte:

São duplas, acomodam duas pessoas, mas espremendo fiquei nela um dia com meus pais e pode-se dizer que deu. Tem um banheiro pequeno com água do rio e não há serviço, apenas recolhimento do lixo. Mas sem dúvidas é uma opção muito boa, pois tem seu espaço, seu banheiro e em alguns casos acesso a uma varandinha! Caso queira interagir, nada impede que isso aconteça o tempo todo pelos corredores, lanchonete, refeitório ou caso vá passear pelo redário. Mas nas suítes não tem onde pendurar nada. É apertadinho e o banheiro tem algumas ferrugens. Mas tem ar, frigobar e travesseiro. Você não precisa levar roupa de cama, só lençol pra cobrir, se quiser.

 

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Alimentação

Pode ser feita no barco conforme horários e valores exibidos na foto.

De Manaus a Belém de barco

 

O café não tomei, pois tinha frigobar na cabine, então trouxemos bastante coisa. Mas almoço e jantar são muito bons, servidos em marmitex e eram gostosos e bem fartos!

Há também uma lanchonete que vende misto quente, hambúrguer, bebidas e salgadinhos. É a única área social, então fica cheia de pessoas bebendo cerveja e batendo papo.

Mas em cada parada – e sempre tem ao menos duas por dia – você é arrebatado pela grande oferta de ambulantes que ficam nos portos a espera de clientes e outros que chegam a entrar no barco oferecendo marmitex, sacolé, queijos, frutas, além de carregadores de celular, extensão e etc.

Então alimentação boa e barata não será um problema.

 

 

Dicas

  • No dia do embarque o navio sai ao meio dia, mas pedem para chegar com umas 3h de antecedência. Caso já esteja em Manaus, você pode economizar o último dia de hotel e já fazer o check in na noite anterior e dormir no próprio navio.
  • Se for ficar nas redes, chegue bem cedo e garanta seu lugar, pois se não vai sobrar só a área próxima aos banheiros.
  • Traga algo leve para se cobrir devido ao ar e quem sabe tampão para os ouvidos, pois a conversa e a música não cessam hora nenhuma.
  • Se ficar nas cabines, tem uma que parece ser a melhor. Ficamos nela por recomendação do Manoel da AR. É a 6, que fica logo atrás da cabine de comando, permitindo mais privacidade e melhor vista.
  • Compre com antecedência, deposite 50% antes e o restante pode ser dividido no cartão na véspera quando for buscar os bilhetes. O endereço é Rua Miranda Leão, 20, próximo ao porto.
  • Traga pouca coisa, pois nem nas redes e nem nas suítes há muito espaço para guardar malas.
  • Com a rede traga também dois pedaços de corda, pois não há ganchos para as pendurar. Ou compre no porto por R$5 ou R$10, dependendo do modelo.
  • No entorno do Porto de Manaus tem redes que são vendidas a partir de R$40.
  • Leve um benjamin ou extensão, pois na cabine não há tomadas sobressalentes e na área das redes elas são bem concorridas.
  • Leve ou compre no caminho uma coisinha para jogar para as crianças das canoinhas, tadinhas. Elas ficam ali esperando. As que estão mais pra baixo do rio então acabam não recebendo nada.

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