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Diário de Bordo

Atravessando o Saara: um tour de 3 dias de Marrakech a Fez, no Marrocos

O Marrocos é apaixonante e o deserto me fascina. Atrelar isso a uma experiência com guias beduínos, pelo deserto do Saara e com um pouquinho de aventura, era tudo que eu mais queria e tanto esperava. Porém esse foi um dos roteiros mais difíceis de encontrar informações em toda minha trajetória de viajante. Eu estava em Marrakesh e, já pensando no tour, comprei o voo de volta por Fez. Mas achei que seria mais fácil. Em vários posts na internet, especialmente em inglês, obtive informações sobre esse passeio custar 70 euros, o que era inacreditavelmente barato. Mas em nenhum deles tive indicação exata de qual companhia utilizar, já que estava inclinada até a pagar um pouquinho a mais por um serviço melhor. Ao procurar na internet por agências que ofereciam esse passeio, 100% das que encontrei e obtive retorno só o faziam em formato privado e os valores variavam entre 280 e 560 euros por pessoa! Ou seja, com antecedência, pela internet, não consegui nenhuma informação precisa que me atendia.

Como o meu hotel desconhecia essa opção de ir até Fez partindo de Marrakesh e passando pelo deserto do Saara, fui para a praça principal de Marrakesh, a Jemaa el-Fna, e pra Medina, onde tudo acontece. Por lá encontrei diversas lojinhas que ofereciam passeios turísticos pela região. Todos atendiam bem, cobravam nessa faixa de 70 euros mas, eu sabia mais que os vendedores. Isso me deixou insegura, por que cada um deles me passava informações desencontradas. Então fiquei com medo de reservar, pagar e não aparecer ninguém para me buscar.

Por fim, voltei na Medina já na véspera do passeio e confirmei a excursão através do Hotel Ali, que fica logo na entrada da cidade antiga. Optei por ele, porque, sendo um hotel, me passou mais segurança, tinha um ponto fixo e um nome a zelar. Além do fato de que o acesso era mais fácil e por eu ter sido bem atendida por uma moça muito simpática e com ótimo inglês. E deu certo! Mas mesmo assim as 2 moças que cheguei a conversar lá (fui em horários diferentes) me passaram informações distintas uma da outra quanto ao roteiro exato.

Agora, se me perguntarem qual operadora que fez nosso trajeto, não sei. E olha que tentei descobrir, mas na van tinham várias pessoas que fecharam em locais diferentes, o que me leva a crer que são apenas pontos de venda que encaixam nas operadoras que tiverem vagas. Queria saber o nome delas pra escolher a melhorzinha ou saber indicar, mas tudo é meio misterioso, especialmente quando o seu motorista (ou guia?) não fala uma palavra de inglês. E tem mais, no final do post vocês vão ver que dividi um táxi com um casal de Hong Kong. Descobri que eles haviam pagado 330 euros cada para fazer um roteiro idêntico porém privado. E no final das contas, se hospedaram nos mesmos lugares que nós.

Então foi assim: um passeio de três dias, onde a cada destino ou parada era uma descoberta nova, já que não há informações precisas. Nem previamente nem durante, pois o motorista não falava uma palavra de inglês nem nós de árabe ou francês. Mas foi inesquecível e incrivelmente barato, se considerar tudo o que fizemos e conhecemos. A minha dica principal é: compre em algum lugar que venda nessa faixa de preço de 70 euros. Os serviços em si (hotel escolhido pra passar a primeira noite, o “tent camp” pra passar a segunda, a comida e o transporte) serão muito similares e a escolha será meio que na sorte, já que não tem em local nenhum uma descrição sobre quem está operando. Eu observei nas outras vans que paravam nos mesmo restaurantes que a gente e era tudo similar, nenhuma tinha nome ou motoristas com crachá.

Mais um dado importante para você ficar atento: todos os posts na internet que encontrei a respeito diziam que o tour acabava em Fez. Mas não é isso o que acontece. Ele termina em Merzouga, onde fica a base pra pegar os camelos, dormir no deserto e voltar no dia seguinte, quando você pega a van de volta para Marrakesh. Caso queira seguir para Fez, tem que pedir pra van te deixar em Rissini, de onde poderá pegar um ônibus – que sai às 10h e chega não sei quando – ou pegue um taxi. É comum encontrar outros turistas querendo fazer o mesmo e você poderá rachar a corrida como eu fiz. Foram 1200 MAD no total para o percurso Rissini x Fez, de aproximadamente 6h. Ufa! Foi bem legal, pois apesar de longo, o caminho é bem bonito. Nem conseguia dormir pra poder admirar a paisagem, as vilas e pessoas pelas quais passávamos.

Percurso dos 3 dias de Marrakesh a Fez passando pelo Deserto do Saara

Percurso dos 3 dias de Marrakesh a Fez passando pelo Deserto do Saara

 

1º dia:

Nos pegaram no hotel de manhã e seguimos por uma cênica estrada, subindo pelo Atlas Mountain. Passamos por Al Hanouz-Zerkten, tiramos fotos em alguns mirantes e vimos pessoas colhendo ou vendendo pedras incríveis pelo caminho. Até que paramos já na região de Ouzazarte (Ighrem N’ougdal), na loja de uma cooperativa de óleo de Argan. Lá eles vendiam o famoso óleo, sempre com o argumento de que “aqui é original, lá em tal lugar não compre pois é chinês”. Mas foi legal conhecer como se extrai. O chão da loja é todo coberto pela casca do argan.

Depois passamos por algumas vilas e belas paisagens e chegamos em Ksar de Ait-bem-haddou, onde almoçamos no restaurante Oásis, recomendo! Lá é bem legal e tem uma bela vista para a cidade antiga de mesmo nome. Após o almoço seguimos a pé até a tal cidadezinha (vila na verdade) que já quase não tem moradores, mas é super emblemática e tem um visual incrível.

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Ksar de Ait-bem-haddou

Atravessamos um rio largo, porém quase seco, mas que no verão chega a 8m de profundidade e alaga as casas da região. Subimos pelos corredores de labirintos até o topo, seguindo o “gentil” guia que sempre nos alertava: “Se for comprar o lenço (que é o passaporte pro homem do deserto), não compre no lugar tal que é falso. Compre só quando eu mostrar o lugar que é de boa qualidade”. E esse alerta de comprar tal coisa somente nos locais de interesse do guia em questão foi nos acompanhando por todos os passeios em Marrocos. Enfim, chegamos no topo da cidade antiga, toda feita de barro e com um visual incrível! Ali vimos os Kasbah, que são casas fortalecidas com quatro torres, onde conviviam famílias de diversas origens. Lá aprendemos um pouco sobre a migração de judeus espanhóis, o convívio pacífico entre eles e os mulçumanos, os nômades do deserto e os bérberes. A cidade foi sendo abandonada, pois seus habitantes partiram à procura de construções mais modernas com água encanada e eletricidade. Dali é possível ver a cidade nova do outro lado do rio. Além dos turistas, ainda existem poucas familias que lá vivem e mantêm seus burricos e cabras em cercadinhos, que se misturam com a casa entranhada na montanha.

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Com toda essa bela paisagem consagrada pelo deserto, as montanhas e essa velha cidade pitoresca, não é à toa que o local é conhecido como a Hollywood Africana. Ali foram gravados cerca de 36 filmes, dentre eles o Gladiador, além da série Games of Thrones.

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Seguimos para a cidade de Ouzarzate em si, que em berbere significa “sem problemas”, passamos pelos estúdios onde são feitas gravações de cinema. De tardezinha atravessamos o Vale das Rosas, que deve ser interessante, mas como já era noite, só paramos no comércio onde tinha todos sabonetes, cremes, e óleos de rosas possíveis. Nos hospedamos no hotel Kasbah de la Vallee em Ait Sedrate Jbel El Spufia, que nos surpreendeu muito! Nós nunca tínhamos informações de nada sobre o que aconteceria no momento seguinte, já que nosso grupo só tinham chineses, japoneses e um casal de Casablanca, que também não falava inglês. Enfim, sem informações, sempre com uma surpresa e pagando 70 euros pros três dias – incluindo o hotel que oferece café da manhã e jantar – foi ótimo! O hotel é até mesmo bonito e tem uma sacada com uma vista linda. Refeições ok e ainda tinha wi-fi!

 

 

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2º dia

Acordamos às 7h30 e tomamos um café simples e sempre com opções doces. Pegamos a estrada e passamos por uma bela paisagem com pedras em formatos interessantes. Tiramos fotos e seguimos pela estrada Gorges du Dadès quando por volta de 9h30 um guia nos encontra e nos leva a pé até a cidade-oásis de Tinerhir.

Gorges du Dadès

É considerada uma das estradas mais perigosas do mundo! Também conhecida por “estrada dos mil Kasbah”, possui 116 km de Ouzarzate até Tinerhir. Por um desfiladeiro no Rio Dadès, suas curvas fechadas seguem serpenteado a cordilheira Atlas produzindo oásis em meio às formações rochosas e áridas, nos proporcionando um belo visual.

Foto: Jelle Oostrom

Foto: Jelle Oostrom

Tinerhir- Toudgha El Oulia

Apesar do lindo dia de sol, estava bem frio – era novembro – e seguimos a pé, acompanhando o guia que passou por uma trilha que margeava o rio cristalino, onde senhoras locais lavavam suas roupas. Para mim esses são os momentos ápices de uma viagem: ver como os locais verdadeiramente vivem, sem formatações para turista ver.

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Nitidamente estávamos em um oásis em meio a tantas horas de estrada árida. Por serem terras produtivas e mesmo os locais sendo de origem berbere, o local é ponto de migração no país, devido às suas melhores condições de vida e pela oferta de água. É parte das Hight Atlas, famosas montanhas do Marrocos e, segundo o guia, rodeada por nômades que vivem no entorno das cavernas e só descem de lá para comercializar. Mais uma vez adentramos uma antiga cidadezinha de barro, com ruínas e casebres. Finalmente tive a oportunidade de entrar em uma casa de verdade! Apesar da demonstração ter sido daquelas para turista ver, foi muito bacana. A casa é escura, cheia de escadinhas estreitas, que nos levam a um área também sem muita ventilação, onde é feito o tear. Nesse momento, o suposto dono da casa nos faz explicações, enquanto sua mulher faz uma demonstração de como retirar a lã e a transformar em um tapete, que – é claro – eles tanto tentam nos vender. Mas dessa vez não houve muita pressão. Inclusive nos ofereceram o whisky berbere, como simpaticamente brincam em relação ao seu chá. Mas tudo sem pedir gorgetas, ufa! Valeu a visita e valeu conhecer um pouco mais da cultura e da casa berbere.

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Vista de dentro de uma casa que tem apenas uma janela.

Vista de dentro de uma casa que tem apenas uma janela.

Depois de pegarmos a estrada novamente, em 5min nos aproximamos de uma região LINDA, havíamos chegado ao Canion de Todgha Gorge. Lá apreciamos o imponente corredor de pedras avermelhadas cortado pelo riacho. O guia nos deixou, após receber a sua gorjeta, e seguimos de carro com o motorista que não nos passava informações. Mas foi bem bacana ver as vilas pitorescas, as mulheres lavando roupas no rio e a bela paisagem. Foram quilômetros e quilômetros de montanhas e dunas a perder de vista, com planícies ao redor da estrada, onde berberes pastoravam suas ovelhas ou, mais raramente, rebanhos de dromendários. O curioso é que não se avistava nenhuma casinha por perto.

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Até que, depois de um momento, paramos para almoçar em um local com um cardápio mais ocidental – e que, ainda assim, depois me fez passar mal. Seguimos por mais vilarejos e um sítio arqueológico, onde resquícios de dinossauros foram encontrados. Portanto lá tem estátuas, museus e etc.

Enfim, atingimos a região de Merzouga um pouco antes do pôr do sol e por ali avistamos diversas placas que indicavam opções de hospedagem (embora só se avistasse as placas e o deserto) e que, com certeza, estariam recebendo grupos como o nosso. Finalmente chegamos ao ponto de partida, um hotel super simples, bagunçado e onde ninguém falava inglês. Intuitivamente vimos que ali seria o ponto de pegar os camelos e seguir para o deserto do Saara até o nosso acampamento. Mas isso demorou mais que o esperado e perdemos boa parte do por do sol. Deixamos nossas coisas ali, o motorista se despediu e seguimos de camelo – dromedário na verdade, mas sempre se referem como camelos – até nosso acampamento, por umas 2h deserto a dentro.

Passeio de camelo pelo deserto do Saara e uma noite em uma tenda berbere

Queria uma expedição maior, se possível atravessar todo o deserto do Saara de camelo, rs. Mas confesso que as 2 horinhas são mais que ideais. Há quem fique com dores após o passeio no andar desconfortavel do bichinho. Após caminhar pelas dunas orientados pelo guia, não se sabe como, mas chegamos no acampamento já com a noite bem escura. O acampamento também estava bem escuro, mas era iluminado com algumas velas, o que dava um charme à experiencia. Por ali, nos acomodamos em tapetes em cima da areia e deixamos a mochila na tenda, também toda feita de tapetes. Aguardamos o jantar e a apresentação berbere na companhia dos gatos que, literalmente, dormiram ao meu lado. Havia um banheiro afastado que era uma tenda sem luz com um buraco no chão e um balde com água do lado. Nos forneceram muitas colchas pesadas pois a noite o frio do deserto do Saara é intenso. O céu estrelado é com certeza o ponto ápice!

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3º Dia

Saimos com os camelos antes do amanhecer, por volta de 5h20, para pegar o nascer do sol nas dunas. Pelo caminho, infelizmente, vi bastante lixo e, curiosamente, 90% era papel higiênico. Acho que haviam outros acampamentos por perto ou era de pessoas que vêm de jeep nas dunas e acabam deixando esse rastro. O que custava enterrar?

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Após um lindo amanhecer, chegamos ao hotel-base, onde tomamos um simples café – sempre pão com geléia e chá – e partimos de táxi desde Rissini até Fez. Como éramos seis, desenbolsamos 200 dihams cada, o que foi um grande alívio, pois de ônibus a viagem era incerta e muito longa. Foi um caminho lindo e cheio de surpresas. O motorista, mais uma vez, não falava uma palavra em inglês e isso foi ficando divertido! Pegamos esse táxi ás 8h41, o casal de chineses e o de Hong Kong que nos acompanhavam logo dormiram, mas minha curiosidade não me permitiu. Adoro reparar os caminhos e esse foi especial. A cada curva uma bela paisagem ou um belo burrico carregando um local. Reparei que lá eles não montam, simplesmente sentam de lado, sempre carregando cestos enormes com lenha ou algo do tipo. Reparei também que na região de Rissini, as pessoas eram mais escuras do que as que eu havia visto nas outras regiões do Marrocos e as mulheres andavam ainda mais cobertas, sempre de preto.

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Às 10h15 passávamos por Errachidia, quando de repente, a natureza nos presenteia com uma surpresa: uma bela represa na paisagem árida! Uma barragem que abastecia a região e misturava paisagens vulcânicas ao seu redor, desértica atrás e com belas águas preenchendo o vale. Era a barragem de Addakhill, a maior em produção de energia do Marrocos.

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Às 12h30 paramos para almoçar no Hotel Taddart, que tem uma bela estrutura, ótimo atendimento e é um oásis turístico no meio do nada. No hotel tinha um mapa lindo e desenhado com os simbolos do que se encontra em cada região e por ali pude observar – descobrir na verdade – o roteiro que estávamos fazendo.

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Às 15h, já de volta com o pé na estrada, começamos a passar por uma paisagem repleta de verde, com muitas ovelhas, camponeses e agricultura em geral. Fui descobrir posteriormente que era o caminho de Ifrane, uma cidade maior e mais moderna, que tem ótimas casas e é mais desenvolvida. É que a localização próxima às montanhas faz com que ela possua mais recursos naturais, o que consequentemte a tornou  mais próspera. Fazia frio e nesse momento descobri que era possível esquiar na região, já que passamos pela Estação de Ski Michelin. A cidade de Ifrane em si é bem européia, tem um belo parque e paisagens que até me remeteram à Suiça.

Por volta de 15h chegamos finalmente a Fez, com a triste sensação de retomar a realidade de uma grande cidade, mas onde muitas outras surpresas também nos revelaram um mundo extremamente encantador.

E aí, gostou da minha aventura pelo deserto do Saara? Se quiser fazer o mesmo e tiver alguma dúvida, me deixe um comentário. Vai ser um prazer ajudar. Beijos

 

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